Bezegol
Aos 43 anos, Bezegol já não é o adolescente que os pais diziam ter voz de “cana rachada”. Humilde e desconcertante fala, em entrevista ao Expresso, das memórias do bairro, do seu quinto álbum e da colaboração com Rui Veloso
Traçar o retrato de Bezegol, um artista que recusa todos os rótulos, em constante “refresh” e para quem “a ausência de fórmulas tem esultado”, é uma tarefa hercúlea. No seu quinto álbum a que chamou “Sete” – divido em três partes que se somam aos quatros registos discográficos já editados – conta com várias participações de outros músicos e amigos, entre os quais Rui Veloso. Juntos fizeram nascer “Maria”, ‘single’ que no espaço de um mês já conta com mais de 400 mil visualizações no Youtube.
Reggae. Funk. Hip-hop. São algumas categorias em que o tentam encaixar, não fossem aparecer pelo meio melodias de guitarra portuguesa e outros elementos que impedem uma categorização. A sua sonoridade passa por muitos estilos, mas não estaciona em nenhum. “Se amanhã me apetecer fazer um álbum com oito fados e dois raps, faço-o”, atira num registo sempre irreverente e descontraído. Bezegol é assim: uma encruzilhada de influências e ideias espontâneas, onde nada é premeditado, tal como tudo aquilo que conseguiu ao longo da carreira.
“Adoro fugir à norma”, confessa o músico portuense, que abriu as portas de sua casa ao Expresso para falar do seu novo álbum. Ainda não foi lançado. Ou melhor, tem vindo a ser disponibilizado. Na era da internet, explica o artista, “deixou de fazer sentido reter os temas em estúdio até todo o processo estar concluído”. Partilhar ‘online’, de forma gradual, as músicas com o público vasto e heterogéneo que conquistou ao longo dos anos é algo que lhe agrada.
“Lá vem aí o Bezegol”, o “puto” com voz de “cana rachada”
Nasceu no bairro da Pasteleira, no Porto, e a humildade ainda está bem patente no seu discurso, apesar de crítico e assertivo. Aos 43 anos, tem opiniões bem vincadas sobre tudo e faz da denúncia do “Sistema” uma marca identitária do seu trabalho. Não se considera um cantor de intervenção, embora tenha crescido a ouvir Zeca Afonso, Fausto ou José Mário Branco. “São gajos que eu admiro e nunca precisei de os ver em revistas cor-de-rosa”, frisa.
Nunca frequentou um conservatório ou uma escola de música. Em casa diziam que o “puto” tinha voz de “cana rachada”, ao passo que os amigos auguravam que iria ser “o gajo mais pesado da rua”. O estranho nome pelo qual é conhecido surgiu no início da adolescência. Com12 ou 13 anos ouvia os mais velhos a falar sobre o ‘bezegol’ [haxixe] e aquilo despertou a sua curiosidade. “Eu via-os falar daquilo com muito interesse. Então comecei a perguntar a toda a gente quem era o Bezegol. ‘És tu o Bezegol? Não? És tu?’”. E assim ficou o nome. Quando passava na rua, todos diziam: “Lá vem aí o Bezegol!”
E vejam onde ele chegou, 30 anos depois e já com um filho maior de idade. Quatro álbuns editados. Conquistou o público e a crítica com um estilo único. Colaborou com algumas das pessoas que muito admira, como Tó Trips [guitarrista dos Dead Combo] ou o alemão Teka que, apesar de não perceber as letras em português, dizia constantemente que o trabalho estava “fucking awesome”. Mais recentemente, partilhou o estúdio com o saxofonista Nanã Sousa Dias e com aquele que é conhecido como o pai do rock em Portugal. “Se há uns anos me perguntassem, eu não acreditava que viria a colaborar com o Rui Veloso”, reconhece.
Discografia:
Álbuns
- 7mm (2019)
- Rude Bwoy Stand (2007)
- S.A.C.A.N.A (2013)
- Rude EP (2009)